Presidência do Brasil: otimismo e hesitação quanto a Michel Temer
Ueslei Marcelino/Reuters
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Michel Temer, atual vice-presidente do Brasil, poderá herdar a presidência do país caso o processo de impeachment contra Dilma Rousseff avance.

Com a crescente probabilidade de Dilma Rousseff, presidente do Brasil, enfrentar um processo de impeachment no início de maio os investidores estão a voltar a sua atenção para o homem que sucederá no cargo.

Michel Temer, vice-presidente, tem diversas características que serão bem-vindas num país em brutal recessão. Aqueles que o conhecem melhor avançam que é pragmático e orientado para os negócios – e que desenvolveu um talento especial, ao longo de uma carreira política de décadas, para forjar acordos com outros legisladores.

No entanto, também se verifica o seguinte: corre o risco de ser forçado a abandonar o cargo por acusações relacionadas com o mesmo processo de impeachment que Rousseff enfrenta. O partido de Temer, Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), o maior do país, irá reunir hoje para determinar se irá abandonar a coligação do governo.

Em pouco mais de 30 anos desde o seu regresso à democracia, o Brasil contou com dois vice-presidentes para sair da crise. Os investidores questionam-se se Temer será mais como o vice-presidente José Sarney e os seus conturbados planos económicos dos anos 80 ou como o vice-presidente Itamar Franco que lançou as bases para anos de crescimento e estabilidade na década de 90.

John Welch, economista do Canadian Imperial Bank of Commerce e observador de longa data do Brasil, que acredita que a ascensão de Temer ao cargo seria um bom desenvolvimento, avança:

“Não existirão milagres, mas há mais possibilidades – estou bastante otimista. É um agregador, como Itamar, um criador de consensos – provavelmente não na medida que o mercado precisa mas certamente muito melhor do que o que temos agora.”

Com o maior défice orçamental registado não haverá muito espaço para Temer adotar medidas de estímulo fiscal. Poderá, no entanto, agir de forma mais eficaz para controlar os gastos de Rousseff no passado – de acordo com Thiago de Aragão, sócio e diretor da consultora de estratégia e risco político Arko Advice.

Ainda mais importante: Temer poderá impulsionar a confiança dos investidores, que paira ao nível mais baixo, com políticas que afastarão a pesada mão do governo da economia – após os 13 anos do Partido dos Trabalhadores, de esquerda, no governo.

Um documento de estratégia avançado pelo PMDB, partido de Temer, em outubro avança que o motor de crescimento baseado no consumo perdeu força – devendo ser substituído por investimento privado e ganhos em termos de competitividade. Refere ainda outras medidas: aumento da idade de reforma; e flexibilidade do mandato constitucional quanto à despesa, para uma melhor alocação de recursos.

Maior papel para o setor privado

O partido sugere, igualmente, uma maior participação do setor privado na indústria do petróleo e propõe a independência total do banco central, com mandatos fixos para os seus diretores – uma proposta muito procurada por investidores apreensivos com a interferência política na política monetária.

A Eurasia Group, consultora na área de análise de risco político, coloca a hipótese de afastamento de Rousseff em 75%. O diretor do grupo para a América Latina, João Augusto de Castro Neves, espera que Temer assuma o cargo em maio.

“Terá uma boa quantidade de capital político desde o início para construir o seu governo, forjar uma coligação no Congresso e passar alguma legislação.” – Afirmou.

Em sinal de apoio a Temer, Aécio Neves, que participou na corrida à Presidência em 2014, atenuou o seu apelo para novas eleições e está agora a apoiar o processo de impeachment que irá colocar o vice-presidente no cargo. Temer atrairia apoio do centro e de partidos da oposição para formar um governo de unidade nacional, capaz de avançar com algumas reformas constitucionais – avançou o senador Tasso Jereissati do PMDB.

Cimentando o apoio, militantes do PMDB avançam que Temer, de 75 anos, se reformaria em 2018, oferecendo a Neves e outros uma hipótese no cargo mais elevado do país.

Não irá concorrer novamente

Presidência do Brasil: otimismo e hesitação quanto a Michel Temer
Zuma\TASS

“Ele assumiria o compromisso de não avançar para a reeleição.” – Afirmou o senador Raimundo Lima do PMDB numa entrevista. “Disse-o não só a mim mas também a senadores da oposição.”

O gabinete de imprensa de Temer não comentou a política económica de um possível governo de unidade nacional mas avançou que Temer tem discutido o cenário político e propostas económicas do PMDB.

Ainda assim, Temer enfrenta uma série de armadilhas que poderão transformá-lo em pouco mais do que um substituto até 2018 – ou poderão forçá-lo a abandonar o cargo. Os partidos da oposição solicitaram a anulação da reeleição de Dilma em 2014, argumentado que foi financiada com subornos da Petrobras. Se o tribunal decidir a favor dos mesmos, o seu companheiro de governação Temer também poderá cair – o que poderá levar à realização de eleições gerais ou a uma votação indireta no Congresso.

Além disso, a investigação de corrupção – que conta já com dois anos – já colocou políticos e executivos de alto nível atrás das grades – e não mostra sinais de abrandamento. Está também focada em membros do PMDB, entre os quais os presidentes de ambas as casas do Congresso, investigados com autorização do Supremo Tribunal Federal. Ambos negam irregularidades.

Desilusão generalizada

O envolvimento de numerosos políticos em escândalos com algumas das maiores empresas do país tem reforçado a desilusão generalizada com a classe política como um todo – incluindo Temer.

Enquanto dois terços dos entrevistados numa sondagem da Datafolha, entre 17 e 18 de março, avançam estar a favor do impeachment de Dilma, apenas 16% acreditam que uma administração Temer seria boa ou ótima.

“Temer será um segundo Dilma.” – Afirmou Paulo Santos, que se juntou a um protesto anti-governo em Brasília, este mês, para expressar o seu descontentamento com a corrupção generalizada. “Precisamos de novas eleições.”

Esse sentimento – de que o Brasil poderá não caminhar para águas mais calmas e de que mais políticos poderão cair – nota-se entre os traders também. Reginaldo Galhardo, gestor na Treviso Corretora de Câmbio em São Paulo, avança que o mercado está tenso. “Parece que ninguém será deixado de fora.” – Lamentou.

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