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Guerra à droga nas Filipinas: o número de mortes nos dois meses subsequentes à vitória eleitoral de Duterte já supera o número de mortes registadas nos primeiros seis meses do ano

Segue-se uma amostra do que uma coligação de grupos defensores dos direitos humanos nas Filipinas descreve como “uma vaga extrajudicial de homicídios de criminosos e de suspeitos de consumo e tráfico de drogas”.

14 de julho, 02:50: Suspeito anónimo nº 43 I San Juan, Grande Manila I Encontrado sem vida, pernas e braços atados, fita cola industrial a envolver a cabeça, 8 pequenos embrulhos de potencial shabu [metanfetaminas] amarrados ao corpo.

13 de julho, 05:00: Evangeline Tan, suspeita de consumo de drogas fora da lista de criminosos da capital I Dasmariñas, província de Cavite I Encontrada sem vida, apunhalada várias vezes, mãos atadas com um cabo elétrico; Mensagem deixada junto do corpo “Wag tularan, tulak ako (A não imitar, traficante).”

Ambas as entradas são da coluna bi-semanal “Lista de Fatalidades” do jornal Philippine Daily Inquirer, que enumera os casos de assassinato de suspeitos de consumo e tráfico de drogas perpetrados quer pela polícia, quer por vigilantes anónimos.

A “Lista de Fatalidades” ilustra uma subida “notória e inequívoca” da carnificina ao dar conta de 265 mortes entre 30 de junho, dia em que o Presidente Rodrigo Duterte tomou o poder, e 18 de julho.

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As estatísticas oficiais corroboram o aumento alarmante do número de mortes de criminosos de droga pela polícia. Dados da Polícia Nacional Filipina avançam que pelo menos 192 suspeitos foram abatidos pela polícia entre 10 de maio e 10 de julho.

A lista de mortes nos dois meses subsequentes à vitória eleitoral de Duterte minimiza seguramente o efeito dos 68 homicídios às mãos da polícia registados em “operações anti-droga” ocorridos entre 1 de janeiro e 15 de junho de 2016.

A polícia atribuiu tais números a suspeitos “que resistiram ou que abriram fogo sobre agentes”, mas não adiantou provas de ter agido em legítima defesa.

O discurso de Duterte

O governo de Duterte ainda não avançou quaisquer propostas que foquem a justiça criminal ou o controlo da taxa de criminalidade. O novo presidente está em exercício de funções há menos de um mês.

Todavia, a posição do governo no que respeita o aumento de crimes pela polícia sobre suspeitos, confirma o menosprezo que Duterte mostrou pela lei Filipina e legislação internacional em matéria de direitos humanos, durante a campanha à presidência.

O antigo candidato asseverou aos eleitores:

"Se eu chegar ao palácio da presidência… É bom que traficantes, criminosos e inúteis me saiam da frente porque os matarei a todos."

Durante a pré-campanha garantiu à multidão apoiante a chacina de milhares de “criminosos”, cujos corpos prometeu lançar à Baía de Manila.

No dia da tomada de posse, o recém presidente identificou a questão da droga como um dos maiores problemas do país e jurou que a luta antidroga da nova administração seria “incansável e sustentada”.

Agora no poder, Duterte acredita que o banho de sangue é testemunho do “sucesso” da campanha antidroga e aconselhou a polícia a “não perder o barco”.

Números e balanço

Após pedidos de inquérito da parte do Senado sobre a vaga de mortes, o diretor-geral da Polícia Nacional Filipina, Ronald dela Rosa, declarou-os “assédio legal”, afirmando que “achincalham a moral” dos agentes.

No mesmo dia, o responsável máximo do braço judicial da nova administração, o solicitador-geral Jose Calida, defendeu a legalidade das operações e acrescentou que o atual número de fatalidades “não é suficiente”.

A Polícia Nacional Filipina vai tornar a vida de Calida mais fácil em breve, ao dar conta do número exato de mortes registadas. A 18 de julho a entidade declarou que vai erguer um quadro eletrónico do lado de fora da sede em Manila, destinado a tornar pública a contagem de suspeitos detidos ou “neutralizados” pelos seus agentes.

Cúmplices de crimes graves

Declarações oficiais sobre o que é, na realidade, a chacina de suspeitos fora dos termos da lei, pode tornar as autoridades cúmplices de crimes graves. E a recusa em investigar a natureza dúbia dos homicídios pode ser entendida como a delapidação de deveres oficiais.

Já houve autarcas, inspirados pela retórica de campanha do novo presidente, a decretar medidas “antidroga” potencialmente abusivas.

Poucos dias após a vitória eleitoral de Duterte a 10 de maio, o presidente de câmara de Cebu, da zona centro do país, Tomas Osmeña, anunciou estar disposto a pagar 50.000 pesos (o equivalente a 1.080 dólares) por cada “criminoso” assassinado pela polícia. Contudo, Osmeña não especificou como poderia a polícia garantir a legalidade das mortes ou a identificação dos suspeitos.

O efeito mais perverso desta abordagem tem sido o aumento de “esquadrões da morte” em cidades do Sul do país com o conhecimento da polícia local e oficiais do governo.

Num relatório de 2009, a Human Rights Watch expôs a conivência de oficiais do governo e de agentes perante a atuação de um esquadrão da morte em Davao. Centenas de pessoas rotuladas como “indesejáveis” – delinquentes menores, traficantes e crianças sem-abrigo de 14 anos – foram assassinadas.

Duterte, que exerceu funções de presidente da câmara de Davao durante 22 anos, aplaudiu publicamente a carnificina.

Nenhum processo judicial deu entrada relativamente às operações do esquadrão da morte de Davao, e o inquérito oficial foi revogado. O grupo inspirou um movimento semelhante na vizinha cidade de Tagum, que por sua vez foi responsável por centenas de mortes enquanto funcionava como uma extensão assalariada da administração municipal.

A erosão do estado de direito

No seu discurso inaugural, Duterte assumiu o compromisso de “intransigência na adesão às regras de justiça e ao estado de direito”. A contagem macabra de vítimas diárias pelas mãos da polícia exige que cumpra o prometido.

O novo presidente terá de dar provas de estar comprometido em seguir as regras de justiça e o estado de direito. Recomenda-se que inicie, com a a máxima urgência, um inquérito independente quanto à natureza destas mortes.

O governo precisa de deixar claro que a proteção dos direitos humanos – que consta da constituição – é aplicável a todo o povo Filipino – mesmo àqueles que a polícia qualifica como “criminosos”.

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