A indústria que, há quinze anos, tinha os dias contados
Há uma década, as ações da maior produtora de cortiça do mundo, a Corticeira Amorim (EURONEXT LISBOA stocks: Corticeira Amorim [COR]), não surgiam como uma grande aposta.
O seu principal cliente, a indústria vitivinícola, começava piscando o olho a produtos mais baratos – que ameaçavam o domínio da cortiça: rolhas de plástico e de metal. Diversos produtores de vinhos premium começaram desprezando a cortiça, alegando a ocasional contaminação dos vinhos, que ganhavam um gosto a mofo.
Isso foi antes. A indústria da cortiça tem vindo encenando o seu retorno: o preço das ações da Amorim, cotada em Lisboa, subiu quase seis vezes e as exportações de cortiça – sendo que Portugal é o principal produtor mundial – recuperaram o seu pico de há 15 anos.
“Quando anda 12, 15 anos, para trás, a previsão para a cortiça era tudo menos otimista. Nos encontramos hoje em território completamente diferente do que a maioria das pessoas achava ser possível então.” – Afirmou Carlos de Jesus, diretor de Marketing da Amorim.
As vendas de rolhas de plástico, em forma de rolha de cortiça, ou de rolhas de alumínio, de enroscar – produzidas por empresas como a australiana Amcor – cresceram, alcançando quase metade do mercado dos EUA, o maior consumidor de vinho do mundo, em 2009 – de acordo com a Cork Quality Control baseada nos EUA.
As rolhas de alumínio passaram a dominar o mercado australiano e são agora também usadas para selar a maioria das garrafas produzidas na África do Sul e Chile.
No entanto, a cortiça tem recuperado – em parte porque se investiu em pesquisa para eliminar a contaminação – um cheiro húmido, a mofo, por vezes causado por fungos microscópicos encontrados na casca da cortiça – e se tem persuadido alguns vinicultores a abandonar o alumínio e o plástico.
Assim, entretanto, a cortiça aumentou a sua quota de mercado nos EUA para cerca de 60% – e a sua participação no mercado global para próxima de 70%, que a Amorim estima rondar cerca de 3,1 bilhões de dólares ao ano.
No entanto, a luta pela quota de mercado está apenas começando
A China está emergindo como enorme novo mercado – com a sua classe média de mais de 100 milhões de pessoas desenvolvendo gosto pelo vinho. A cortiça e as suas rivais estão envolvidas em uma batalha pelos corações dos amantes de vinho na China – e por agora parece que a cortiça está ganhando.
“É uma tradição, representa prestígio.” – Afirmou Matthew Gong, porta-voz da maior importadora chinesa de vinho, a ASC Fine Wines, baseada em Xangai.
Contudo, acrescentou, os consumidores chineses poderão se tornar menos sensíveis à questão da rolha, especialmente camadas mais jovens bebendo vinhos mais baratos.
“Cada vez mais consumidores não se importam se se trata de uma rolha de cortiça ou de uma rolha de enroscar, de metal.” – Afirmou. “Mas para vinhos de topo a cortiça é claramente a preferida.”
As exportações de cortiça de Portugal para a China saltaram 22% em 2016, de acordo com a APCOR, associação portuguesa de fabricantes de cortiça. Como crescente consumidora, a China tem também potencial para influenciar como as produtoras selam as suas garrafas – nomeadamente no mercado australiano, do qual é a maior consumidora, dominado pela rolha de enroscar. Porém, de acordo com Tony Battaglene, da Winemakers’ Federation of Australia, cerca de 90% das garrafas produzidas na Austrália são seladas com rolhas de enroscar.
Resposta à crise: lasers e robôs
Na guerra contra rolhas de plástico e de metal a Amorim investiu em robôs, lasers e máquinas de análise cromatográfica capazes de detetar a quase invisível contaminação. A casca da cortiça é cuidadosamente retirada dos sobreiros, essencialmente da região do Alentejo, e depois é processada em placas nas fábricas da Amorim perto do Porto, no norte de Portugal. Essas placas são, de seguida, tratadas a vapor, cortadas em pequenos pedaços e levadas por braços robóticos para máquinas que as perfuram como rolhas. São classificadas e polidas com recurso a lasers. As rolhas de melhor qualidade são ainda perfuradas à mão antes de passarem pelas máquinas de análise cromatográfica.
A I&D foi a resposta à crise da indústria, que atingiu um pico no início dos anos 2000 quando até mesmo fabricantes europeias de vinhos premium começaram usando rolhas de plástico e alumínio.
João Rui Ferreira, presidente da APCOR e CEO da WFScork, produtora de rolhas, afirmou que a cortiça não pretende voltar ao domínio total do final do século XX, quando detinha 95% do mercado global. Em vez disso, se foca em vinhos premium – naquele que é agora um mercado global muito maior.
“As tendências são muito claras. O consumo de vinho no mundo está mudando de volume para valor.” – Afirmou.