A Bitcoin e o Snapchat são dois produtos bastante populares — e embora distintos no centro do seu sucesso se encontra a mesma ideia contraintuitiva. Compreendê-la poderá nos ajudar a determinar qual a próxima "big thing" do mundo da tecnologia. [A opinião de Tony Aubé, partilhada no Hacker Noon].
Bitcoin
Um dos mais importantes recursos dos computadores é o fato de serem capazes de duplicar informação facilmente.
É difícil apreciar o quão conveniente isso é. Antes dos computadores, se enviasse uma carta escrita à mão a mesma «se ia». Só havia uma versão da carta no mundo. Hoje, é possível enviar o mesmo e-mail a uma quantidade infinita de indivíduos.
Uma grande parte dos anos 1990 e 2000 se prendeu com a habituação a este novo mundo onde a informação, a música, os filmes, e outros podem ser continuamente duplicados e partilhados. Agora, já estamos habituados a isso. Tomamo-lo por certo.
Porém, a Bitcoin veio mudar a situação.
Uma das grandes inovações proporcionadas pela Bitcoin é a escassez digital. Uma Bitcoin é digital, mas é única também. Tal como um e-mail, pode enviar uma Bitcoin para qualquer pessoa no mundo. Porém, ao contrário do e-mail, não pode duplicá-la. Tal como uma carta escrita à mão quando enviar uma Bitcoin a mesma «se vai».
De certa forma a Bitcoin nos leva de volta aos dias pré-computadores. A sua maior inovação não se prende com o acrescentar de novos recursos — se prende com a remoção de um: a capacidade do computador para duplicar elementos digitais.
Esta ideia é tão simples que é quase idiota. Ainda assim criou um mercado de cerca de 300 bilhões de dólares (285 bilhões à hora de escrita). Lançou milhares de novas start-ups e mudou completamente a forma como pensamos sobre a tecnologia, finanças e governança.
Snapchat
Outra característica dos computadores é que, por padrão, registram tudo.
Assim, nos anos 2000, quando o Facebook e o Twitter levaram as nossas vidas pessoais para o mundo digital, passamos encarando algo novo: qualquer interação que temos nesse mundo fica registrada para sempre.
Não o percebemos na altura mas havia algo de extremamente bizarro sobre isso. Isto porque, na vida real, as interações humanas não duram para sempre. Se desvanecem. São efêmeras.
E então surgiu o Snapchat e a sua grande inovação: as mensagens efêmeras.
Tal como a Bitcoin, o Snapchat nos levou de volta para os dias pré-computadores. As conversas digitais passaram a poder desaparecer tal como na vida real. Foi um sucesso instantâneo.
Tanto quanto o verificado com a Bitcoin, uma das grandes inovações do Snapchat não se relaciona com o adicionar de um novo recurso. Se tratou da remoção de um recurso: da capacidade dos computadores para registrarem tudo.
Uma vez mais, uma mudança simples e contraintuitiva criou um mercado significativo: uma empresa avaliada em cerca de 16 bilhões de dólares e um recurso hoje usado por mais de 1,2 bilhões de indivíduos em todo o mundo.
Conclusão
A Bitcoin e o Snapchat são produtos muito diferentes, mas no centro do seu sucesso está a mesma ideia: em vez de adicionarem novos recursos, removeram recursos. Os seus criadores analisaram com atenção as propriedades fundamentais dos computadores, neste caso o registro e a fácil duplicação de informação. Enquanto todos achavam que essas propriedades surgiam como intrínsecas aos computadores, os seus fundadores as removeram. Ao fazê-lo, criaram produtos bem-sucedidos e usados em todo o mundo.
Tal se verificou pois tornaram a tecnologia mais humana. Aproximaram-na do que a vida era antes dos computadores.
Creio que a Bitcoin e o Snapchat são apenas a ponta do icebergue. Haverá muitas oportunidades por descobrir. Em um mundo em que todos competem para encontrar o próximo recurso inovador — realidade aumentada, realidade virtual, inteligência artificial, etc. — qual será a chave? Construir novos recursos ou removê-los?
Os computadores são enigmáticos. Têm propriedades fundamentais que os tornam completamente diferentes da forma como evoluímos nos últimos milhões de anos. São rápidos. Duplicam e transmitem informação sem esforço. Registram tudo.
Os anos 1990 e 2000 serviram para nos habituarmos a essas novas invenções. A próxima década será sobre torná-las menos estranhas, mais reais.