A Art Basel começou na passada sexta-feira em Hong Kong. O evento não é apenas importante por motivos artísticos, pois é também um foco de investimento. E você, pensa em investir em arte?
Não iria ter sorte se quisesse encontrar um quarto de hotel em Hong Kong este fim-de-semana. A Art Basel Hong Kong abriu na passada sexta-feira 13, e uma grande parcela da arte global do mundo desceu à cidade.
A Art Basel é a maior feira de arte da Ásia, mas tem muita competição pelo mundo. Existem agora 180 feiras internacionais de arte a acontecer anualmente, que rendem mais de 10 mil milhões de euros em vendas. As camadas de topo das feiras de arte, cerca de um quinto do total, trazem todas juntas mais de um milhão de visitantes por ano, e ajudaram a conduzir o mercado de arte global a um recorde de vendas de 51 mil milhões de euros em 2014.
Colecionar arte, uma vez uma procura esotérica, tornou-se norma para o 1% global, e as feiras que atraem os grandes gastadores são uma indústria legítima em si mesmas. Estas feiras de topo trazem uma enchente de visitantes ricos e bem conhecidos onde quer que aterrem – este ano entre eles, em Hong Kong, estiveram o colecionador Ulli Sigg, o diretor do Tate Nicholas Serota, a atriz Susan Sarandon, e o fundador da Alibaba, Jack Ma.
Na noite de abertura, os hóspedes no salão VIP tomaram Brandy Warhols: cocktails servidos em "latas" de sopa Campbell com gravuras famosas de Andy Warhol na parede atrás deles, parte da coleção de arte do patrocinador da feira – UBS. Pode ser vendida arte no valor de $3 mil milhões até à altura em que a feira acaba, no dia 17 de Março – estima a seguradora Axa.
Não há muito espaço para pensar
A crescente indústria das feiras de arte é boa para os proprietários das feiras, e para os negócios de compra e venda de arte. Mas pondo o dinheiro de parte, o que é que está a fazer pela arte?
No seu melhor, a arte é uma porta para um espaço contemplativo. Como todas as artes, as artes visuais respondem à nossa inata e incansável procura por algum sentido. A arte pode elevar-nos da nossa egoísta visão do mundo e oferecer-nos uma nova maneira de observar e de questionar a nossa realidade. Mas qualquer espaço para esse tipo de contemplação existencial é praticamente inexistente nas maiores feiras de arte do mundo.
A palavra operacional para a maior parte das pessoas associadas com estas feiras é frustração. Como um colecionador me disse:
“É como se nos oferecessem este enorme banquete e depois nos dissessem ‘têm dois minutos – comam o que quiserem.’”
Coletores sérios desesperam quando as suas conversas com artistas são interrompidas por visitantes das feiras com segundas intenções, ou por coleccionadores ainda mais importantes (pode determinar a sua posição na vida pelas horas a que o seu passe VIP lhe permite entrar numa feira de arte no dia da abertura). Os proprietários de galeria, ainda com o jetlag da última feira, estão mais stressados com os preços astronómicos das bancadas – que em feiras como a Art Basel podem chegar aos $60 000 – que com o oferecer aos visitantes uma experiência significativa.
Será o fim dos conhecedores?
Jessica Hromas/Art Basel
Um proprietário de galerias em Londres, que representa vários artistas de sucesso no mercado e entre os críticos, gosta de resmungar que o crescimento das feiras de arte significa o fim da especialização, do “connoisseur”. “A razão por que entrei no negócio da arte é porque adoro arte,” disse ele. Ele adora falar com os artistas e com os coleccionadores que querem realmente compreender o trabalho. As feiras de arte, no entanto, são a sua parte menos preferida do trabalho – e são o que ele, e a maioria dos proprietários de galerias, têm de passar mais tempo a fazer.
Os artistas sobre pressão das galerias têm de por de parte o trabalho que querem realmente fazer e produzir algo que tenha uma maior probabilidade de vender. Apesar de apreciarem a exposição internacional que as feiras lhes dão, muitos estão descontentes com as condições de exposição. Um artista em ascensão que tem uma exposição a solo este fim-de-semana na Art Basel em Hong Kong, disse:
“O meu trabalho consiste em projetos de longo termo, e a natureza fugaz da feira de arte não conduz o tipo de interação que eu e outros artistas precisamos para manter as nossas práticas.”
O pior é que as feiras de arte estão na verdade a ajudar a retirar a arte do olho público. Com os mercados financeiros e paraísos fiscais a serem mais regulamentados, os 1% estão cada vez mais a contar com a arte e as feiras de arte como formas de guardarem o seu dinheiro. Depois guardam a arte em armazéns que crescem em número na Europa – muitas vezes na Suíça, mas cada vez mais também em Singapura e Hong Kong.
Ao contrário da entrada grátis que muitos museus oferecem pelo mundo, os bilhetes para uma feira de arte não são baratos. Enquanto os ricos têm passes VIP e são levados do tráfego da cidade por carros oficiais, o público que tem de pagar para entrar sente o golpe nas suas carteiras, e há muitos que não podem dar-se a esse luxo. Os bilhetes para a Art Basel em Hong Kong ultrapassam os $30 por dia. Muitas vezes, as pessoas que visitam as feiras só por interesse na arte dão por isso a observam as bancadas cheias de arte sem nenhuma ordem especial, a não ser a ordem do título corresponder à etiqueta com o preço.
Lars Nittve, diretor do M+, um museu de arte contemporânea que vai abrir em Hong Kong em 2017, disse que aprecia que as feiras de arte façam parte do ecossistema, mas disse que a sua concentração nas vendas distrai da arte em si mesma.
“Olhar para a arte com uma etiqueta pode certamente estragar a experiência. Há coisas que não se vêem e as intenções originais do artista podem ser obstruídas pelos valores do mercado. A etiqueta não é a razão por que a arte foi feita.”
Apesar de toda a apreensão, os proprietários de galerias e artistas sabem que não têm realmente nenhuma outra escolha. O mercado da arte é global e as feiras de arte são as montras.