Como a Bitcoin surge como símbolo de estatuto social
Brian Lawless/PA via AP
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12 de Janeiro de 2018

Como pode a subida de preço de uma bebida alcoólica chinesa explicar a economia da Bitcoin? Se trata, entre outros aspetos, de uma questão de estatuto social. Compreenda porquê.

Procurando contextualizar o aumento meteórico de preço da Bitcoin, analistas da Bernstein Research compararam os principais fatores por detrás da demanda por determinados produtos chineses de campos distintos: medicamentos e bebidas alcoólicas.

“As bitcoins não fornecem liquidez ou outros benefícios aos investidores. Porém, a oferta de bitcoins é limitada. Assim, o seu preço é impulsionado por especulação ao redor de potencial demanda.” — Avançaram os analistas.

Há, na realidade, um certo grau de incerteza ao redor da demanda por criptomoedas. Quantas pessoas realmente querem criptomoedas? E por que razão as querem? Quantas quererão no futuro? Será que quererão em uma base contínua por um longo período de tempo? Esta incerteza ao redor da demanda contribui para a volatilidade do preço das criptomoedas e da Bitcoin em particular.

Mais: são várias as plataformas de câmbio de criptomoedas não reguladas pelo mundo — entre as quais o preço da Bitcoin pode variar significativamente.

Com isso em mente, analistas da Bernstein contrastaram a situação vivida pelas criptomoedas, pela Bitcoin em particular, com a demanda por um medicamento tradicional chinês derivado da pele de burro — conhecido como E.Jiao — e usado para enriquecimento do sangue e anti-envelhecimento.

Em 2016 a China produziu 5.000 toneladas de E.Jiao, o que exigiu 2,5 milhões de peles de burro.

Porém, a população de burros está diminuindo no país, o que tem conduzido a imitações baratas derivadas de pele de vaca e cavalo.

Assim, a principal fabricante do produto original, a Dong E-E.Jiao, beneficiou daquilo a que a Bernstein Research chama “escassez credível”.

Não existe oferta ilimitada de E.Jiao, tal como não existe oferta ilimitada de Bitcoin. No entanto, o produto chinês beneficia de elevado grau de certeza quanto a demanda subjacente.

Como tal a Dong E. aumentou o preço do E.Jiao 18 vezes ao longo da última década.

Entretanto, algures entre a Bitcoin e o E.Jiao encontramos a Fetien — marca de baijiu, um licor chinês bastante popular.

Servir baijiu a convidados é uma forma dos chineses afirmarem o seu estatuto na sociedade, o que o torna aquilo a que economistas se referem como bem de Veblen — bens materiais para os quais a demanda é proporcional ao preço elevado.

A teoria econômica básica sugere que quando os preços caem mais pessoas compram determinado produto.

Porém, no caso dos bens de Veblen — onde se incluem marcas de topo e carros luxuosos — o aumento de preço geralmente reforça o estatuto social associado ao produto, tornando-o mais desejável.

A Bernstein Research considera-o o “valor snobe” do produto.

A Bitcoin apresenta algumas características de bem de Veblen — com o seu preço aumentando por poucas mais razões além de ser algo cool.

“Em meados de 2017 conduzimos uma pesquisa junto de consumidores de produtos chineses premium. A mesma mostrou que a demanda por bens de Veblen é o terceiro mais importante fator por detrás da escolha de marcas como a Fetien e a sua principal concorrente Wuliangye. No âmbito da pesquisa, 32% dos inquiridos confirmaram que ‘Servi-la mostra respeito pelos meus convidados’ como razão-chave para a escolha da marca. Mais: ’É apropriado para pessoas como eu beber esta marca’ também surgiu no top 5 das razões por parte de 23% dos inquiridos.” — Afirmou a Bernstein.

“Especificamente quanto ao baijiu da Fetien: ‘Bebê-lo/Servi-lo mostra que sou bem-sucedido’ é a razão através da qual 27% dos inquiridos justificam a escolha da marca.”

“Este tipo de demanda por bens de Veblen foi um dos fatores que levou o preço ao consumidor da Fetien a subir cerca de 400% entre 2007 e 2012 — e a aumentar 64% nos últimos 12 meses.”

Parte do valor da Bitcoin, da fórmula medicinal da Dong E (E.Jiao) e do licor de baijiu da Fetien deriva da oferta limitada.

Fundamentos distorcidos

No entanto, como referido, o E.Jiao também beneficia de certeza de demanda. Por sua vez, os níveis de demanda não são claros nos casos da Bitcoin e do baijiu. Assim, tal como a maior criptomoeda do mundo, a Fetien tem estado suscetível à distorção de fundamentos do mercado.

O primeiro ocorreu no final dos anos 2000 com défice de oferta: distribuidores acumularam estoque o que serviu para reduzir a oferta.

Tal tem alguma semelhança com a Bitcoin: se estima que 1.000 pessoas detenham cerca de 40% de todas as bitcoins disponíveis.

A situação da Fetien se inverteu bruscamente quando o governo chinês lançou uma campanha anti-corrupção em 2012 e o mercado foi inundado com excesso de estoque.

Em comparação, o mercado de criptomoedas também já foi alvo de ação das autoridades chinesas.

Será interessante perceber o futuro do mercado das criptomoedas e da Bitcoin em particular. É provável que o amplo aumento de popularidade do mercado leve a que seja cada vez mais controlado por autoridades fiscais, bolsas de valores e bancos. Que impacto terão esses desenvolvimentos na demanda?

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