Lápis de sangue: como a exploração mineira financia a violência no Afeganistão
Ahmad Masood/Reuters
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A exploração mineira de lápis-lazúli já é a segunda maior fonte de rendimento dos talibãs

No norte do Afeganistão, um homem amarra 90 kg de lápis-lazúli às costas e transporta-os montanha abaixo – uma montanha demasiado íngreme, até mesmo para os burros. No entanto, os lucros para os grupos armados, incluindo os talibãs, serão enormes: em 2015 reuniram 12 milhões de dólares da exploração mineira de lápis-lazúli, de acordo com um novo relatório da Global Witness.

Este ano, os talibãs deverão reunir mais de 50% desses lucros, de acordo com o mesmo relatório divulgado esta segunda-feira.

Stephen Carter, autor do relatório, define a extração mineira como um “enorme ponto cego estratégico”. Avança ser particularmente alarmante a exploração mineira ser considerada “uma espécie de questão económica ou de corrupção, mais do que uma potencial ameaça à segurança.”

A Província de Badakhshan, rica em lápis-lazúli, tem estado fora do controle do governo nos últimos dois anos, depois do antigo chefe da polícia do distrito, comandante Abdul Malek, ter tomado as minas num golpe em 2014. Os moradores locais, que há muito se queixavam de não poder trabalhar nas minas – vivendo à margem dos lucros – apoiaram o golpe.

Lápis de sangue: como a exploração mineira financia a violência no Afeganistão
AP Photo/Rahmat Gul

Sob o regime de Malek a vida dos moradores melhorou ligeiramente, até mesmo porque as coisas estavam muito más antes.

“Houve bastante zulm [crueldade] antes – não que haja menos.” – Avançou Ghulam Mohammad, mineiro local, à Global Witness no seguimento do golpe. “A infelicidade diminuiu de 100% para 40%.”

Outros ficaram felizes por Malek, ao contrário dos funcionários do governo que controlavam as minas antes de 2014, ter reinvestido algum do dinheiro na comunidade – incluindo na reparação de uma estrada local e na construção de uma mesquita.

No entanto, o benefício para os moradores é ainda muito ligeiro e o próprio governo afegão quase que não recebe receitas da mina (através de impostos). O U.S. Special Inspector General for Afghanistan Reconstruction terá enviado um aviso a Cabul a afirmar que o comércio de lápis-lazúli no país estava a ser subestimado e que milhões de dólares em lucro seguem para senhores da guerra e funcionários corruptos.

Numa recente entrevista à Foreign Policy, um funcionário da União Europeia afirmou que a receita fiscal obtida da exploração de lápis-lazúli correspondia a quase nada, apesar dos lucros maciços alcançados por indivíduos poderosos e grupos armados.

Enquanto isso, funcionários do governo afegão poderão estar a lucrar ilegalmente com a exploração mineira. O relatório da Global Witness avança que os grupos armados associados a um parlamentar afegão, Zulmai Mujadidi, receberam 700.000 dólares da exploração de lápis-lazúli em 2014.

De acordo com o funcionário da União Europeia:

“Toda a gente tem dedo nisto – os talibãs, grupos criminosos, senhores da guerra, funcionários do governo, forças de segurança. (...) Estão todos envolvidos.”

Os talibãs têm tirado vantagens do caos, alcançando lucros suficientes para tornar a exploração mineira a sua segunda maior fonte de rendimento, a seguir ao comércio de papoila. Apenas em 2014, de acordo com o relatório, Malek entregou mais de 750.000 dólares ao grupo extremista – seu antigo inimigo.

A maioria do lápis-lazúli segue através do Paquistão para a China, onde é um item de luxo.

Segundo Carter:

“Se o governo chinês disser ‘Vamos proibir o comércio de lápis-lazúli até o mesmo deixar de beneficiar grupos armados’ a situação muda completamente.”

Tal dependerá do quão preocupados os chineses ficarem quanto ao quão próximos os talibãs de Badakhshan se tornarem do Estado Islâmico no Afeganistão. É também de notar que os uigures, chineses muçulmanos que Pequim considera uma ameaça terrorista, se terão juntado a grupos de combatentes estrangeiros em Badakhshan, de acordo com o relatório.

No entanto, o problema é maior do que apenas o lápis-lazúli. Grupos ilegais ou marginalmente legais estão também a extrair turmalina, ouro, carvão e outros recursos no Afeganistão.

Washington concedeu ao Afeganistão cerca de 500 milhões de dólares para o setor da exploração mineira “com muito pouco do mesmo a seguir para a governação.” – Afirmou Carter.

Fonte: ForeignPolicy

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