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A fatia de mercado mínima e a competição feroz fazem crer que provavelmente a decisão mais sensata por parte da Uber seria deixar a China. Porém, num ressuscitar da teoria do dominó defendida pelos norte-americanos durante a Guerra Fria, existe a crença de que se a Uber não estiver presente num determinado país, acabará também por cair nos países circundantes, e assim sucessivamente. Esta teoria fará sentido?

Os dois maiores criadores da aplicação de car-hailing (chamar um táxi/carro/limousine/etc) do país – Kuaidi Dache e Didi Dache – acabaram de anunciar uma fusão. Juntos são 99,8% do mercado de procura de “boleias”. A China tem uma enorme e crescente população de utilizadores de telemóveis e potenciais clientes. Mas o que é que a Uber ganha realmente ao lutar por esta fatia do tamanho de um cabelo do mercado chinês?

A Uber vai, provavelmente, tentar ficar na China, se por mais nada, para provar que tem um potencial global para validar a sua avaliação atual de 41 mil milhões de dólares, e propor-se a uma oferta pública inicial gigante no futuro.

Lembremos a teoria do dominó dos livros de história. A doutrina da época da guerra fria ditava que se um país abraçasse o comunismo, então os seus vizinhos cairiam inevitavelmente nos braços da peste vermelha. Quer a ameaça fosse real ou não, os gurus das políticas estrangeiras dos Estados Unidos dependiam disso para justificar décadas de intervenção global.

A versão da Uber da teoria do dominó segue um pouco o mesmo esquema:

Se um país não adere à Uber, então talvez outros países não adiram também. Por isso a Uber tem de estar em todo o lado, mesmo se não fizer sentido do ponto de vista do negócio.

Perder nos mercados globais não ameaçaria a existência da Uber, mas ameaça a premissa que suporta a sua enorme avaliação – que as aplicações de chamamento de táxis são mercados em que o vencedor arrecada tudo e que a Uber pode ser a mais importante opção na maior parte das cidades maiores do mundo.

Quando a Uber aumentou a sua última ronda de fundos, o membro do conselho Bill Gurley disse ao Wall Street Journal que, “A expansão internacional é provavelmente o tema chave da angariação de fundos.” A Uber já marchou sobre mais de 250 cidades em 54 países (e a aumentar) pelo mundo.

A China, surpreendentemente, é um peão na estratégia de expansão global da Uber. Quase todas as companhias internacionais tentaram encontrar uma forma de fazer lucros da grande economia em desenvolvimento e da classe média crescente da China. O sucesso da Apple na China contribuiu significativamente para o sucesso público recente deste trimestre. Companhias como o Facebook e a Google, há muito bloqueadas na China, estão a tentar encontrar maneiras de chegar aos 649 milhões de utilizadores de Internet. (Sim, duas vezes a população de todos os EUA)

A Uber parecia posicionada para fazer algum progresso quando recebeu um investimento da Baidu da China, uma companhia de pesquisa na Internet, em Dezembro. Como parte do acordo, a Uber tinha acesso à tecnologia de mapeamento e, potencialmente, à influencia da companhia num país onde os jogadores locais são preferidos aos estrangeiros.

Igualmente importante para a Uber foi o fato de que Kuaidi Dache e Didi Dache também estavam no meio de uma guerra brutal de preços na altura, que ameaçava o futuro de ambos os negócios. Mas Kuaidi e Didi decidiram fundir-se, o que quer dizer que não precisam de manter os preços tão baixos. Eles vão apoderar-se do mercado enquanto os competidores vão desaparecendo.

Companhias que se querem unir na China, não têm de ter o acordo revisto por reguladores chineses a não ser que tenham uma receita combinada de cerca de $320 milhões.

Se Kuaidi e Didi não fizerem, em conjunto, mais de $320 milhões e no entanto representam quase todo o mercado de car-hailing chines, será então proveitoso para a Uber lutar por uns pouco milhões que sobram? O tamanho total da tarde vai crescer, mas ainda parece muito trabalho para poucos ganhos.

Mas se a Uber deixar a China, onde é que vai chegar? Também deixará o resto do sudeste asiático só porque a Grab Taxi, baseada na Malásia, diz que é o jogador dominante na Malásia, Filipinas, Tailândia, Singapura, Vietnam e Indonésia? Deixará também outros países como o Brasil, se é pouco provável que tenha o monopólio nas grandes cidades?

Consegue ouvir os dominós a cair?

Se a Uber saísse destes mercados exporia a companhia a uma questão que pus em Dezembro: Serão as aplicações de chamamento de táxis um negócio global?

Não acho que sejam. Elas não têm o alcance global inerente de uma cadeia de hotéis, companhias aerias, ou mesmo companhias de arrendamento de casas como a Airbnb, todas as quais tomam conta de pessoas que viajam entre fronteiras e que têm uma fidelidade com a marca.

Numa cidade, a lealdade a um serviço automóvel resume-se à velocidade e conveniência.Costumo usar a Uber em São Francisco onde é normalmente a opção mais rápida. Mas em Nova Iorque, os táxis amarelos passam por nós com tanta frequência enquanto esperamos por um Uber que parei de utilizar a aplicação de todo. A maioria das vezes a Uber é mais lenta em Nova Iorque, mesmo que os carros sejam mais limpos e os motoristas ofereçam garrafas de água.

Sam Lessin, um antigo executivo do Facebook e colunista no Information, teve uma experiencia semelhante quando esteve em São Paulo. Ele escreve:

"A disponibilidade da [aplicação de partilhar viagens] 99Taxis é muito melhor que a Uber. Nem está perto na verdade. Várias vezes, vi alguém a abrir a aplicação Uber e saltar logo para um 99Taxis porque havia um aumento dos preços X1,5 ou porque o carro demoraria muito tempo… a minha experiência em São Paulo reforçou a minha ideia que a companhia não é necessariamente um monopólio global natural."

Apesar de contrariar a narrativa dominante da Uber, a companhia foi deixada muito para trás na China, e tem uma grande competição nos mercados locais no resto do mundo. Mas a Uber e os seus investidores não podem ceder a essa realidade, porque senão os dominós começam a cair.

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