Já pode investir em “criptobrigações”
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A mesma tecnologia em que se baseia a bitcoin é agora também aplicada ao mercado de obrigações. Quais serão as vantagens e desvantagens deste instrumento?

A tecnologia que sustenta a bitcoin e outros tipos de moeda digital acabou de dar mais um pequeno passo em direção à legitimidade. Bem, mais ou menos. O Overstock.com, um distribuidor online de vários tipos de bens tais como joalharia ou mobília, que já aceita bitcoins como meio de compra, está a vender aquilo que o seu CEO Patrick Byrne chama de a primeira “criptobrigação” (do original cryptobond) do mundo:

A revolução cripto chegou a Wall Street. Estamos a torná-la oficial oferecendo a primeira criptosegurança do mundo.

Chamem-me um pouco “criptocético” se quiserem. O mercado de obrigações está a lidar com a sua quota-parte daquilo a que um consultor poderia chamar de “problemas”, principalmente em relação à evaporação da liquidez e à perspetiva do Banco de Reserva Federal ir fazer algo que parece ser a primeira vez desde que há memória - aumentar as taxas de juro. Mas Byrne está a disponibilizar uma solução a um problema que ninguém no mundo do rendimento fixo pensava que tinha.

Overstock – que tem uma capitalização bolsista de $548 milhões e teve rendimentos de cerca de $1,5 mil milhões no ano passado – disse que está a planear vender $25 milhões em obrigações digitais “para negociar num livro comercial protegido criptograficamente” chamado TØ.com. Essa plataforma sustenta a denominada tecnologia blockchain que controla quem possui Bitcoins e teoricamente, será um modo mais seguro de os obrigacionistas terem a certeza da sua titularidade das obrigações do Overstock.

O CEO Byrne, que pagou $500.000 como primeiro comprador das criptoseguranças, segundo um comunicado de imprensa que a empresa lançou na segunda-feira, tem uma história, no mínimo, interessante. No ano passado, a revista Wired chamou-lhe de “Messias da Bitcoin”. A revista Fortune fez uma comparação dele de agora há 15 anos atrás quando tinha 37 anos e apontou algumas das suas conquistas até agora:

Tirou um doutoramento em filosofia na Stanford e é cinturão negro em hapkido e tae kwon do. Já viajou pelos E.U.A de bicicleta três vezes, estudou filosofia moral em Cambridge como um colega Marshall e tentou por pouco tempo uma carreira no boxe. Byrne também fala mandarim – para não mencionar quatro outras línguas estrangeiras – e traduziu “O Caminho da Virtude” de Lao Tse durante o seu último ano em Dartmouth. Ele tem uma memória quase fotográfica, algo de que tem orgulho de mostrar com o que ele chama de truque de memória: se ele estudar um baralho de cartas por alguns minutos, consegue recitá-las todas, uma a uma, tanto para a frente como para trás.

É difícil para mim, deixar de lado a minha desconfiança em relação à dita obrigação que, baseando-me na limitada informação disponibilizada pelo comunicado de imprensa, parece faltar atributos básicos tais como uma taxa de juros ou um prazo de vencimento, e cuja existência parece ser à mercê digital da mesma entidade a quem se está a emprestar o dinheiro. Mas eu posso ser uma minoria. A tecnologia blockchain (pode ler uma definição aqui ou ver um vídeo aqui) que serve de base para os Bitcoins e as novas obrigações do Overstock está a ganhar força no mundo financeiro.

Blythe Masters, a quem muitos dão o mérito por ter inventado um canto do mercado de derivados denominado swap de risco de incumprimento na altura em que ainda trabalhava na JP Morgan, tendo sido também a antiga diretora da Global Financial Markets Association, é atualmente a CEO da Digital Asset Holdings, que planeia utilizar a tecnologia para assentamentos no mercado de valores mobiliários. No mês passado, o ex-secretário do Departamento do Tesouro dos E.U.A Larry Summers, o antigo diretor executivo do Citibank John Reed e o fundador da Visa Dee Hock juntaram-se ao conselho executivo da empresa startup da Bitcoin Xapo, que oferece armazenamento online seguro para a moeda virtual. E a Nasdaq afirmou que poderá utilizar a tecnologia blockchain na sua gama de produtos comerciais.

A própria Bitcoin está ainda muito em baixo, pelo menos em termos do seu valor de mercado. A Bitcoin perdeu três quartos do seu valor contra o dólar desde a sua ascensão, e atualmente são comercializados a cerca de $227.

Contudo, tudo isso pode muito bem ser provado irrelevante. Tal como Noah Smith da Bloomberg View explicou em janeiro, o verdadeiro valor das moedas digitais é o servir de meios comerciais alternativos, não de investimentos; os livros comerciais digitais também podem ter um potencial valor que pode ser explorado pelo mundo financeiro, tal como as pessoas luminárias como a Masters estão a demonstrar. Mas o que deve ser suficientemente claro é que a oferta de obrigações da Overstock cheira mais a oportunismo engenhoso de que a progresso tecnológico.

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